Seção 1:
Sociedades Auto-suficientes e Independentes (Samajas) |
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O termo em sânscrito que designa sociedade é
samaj, que quer dizer um agrupamento de pessoas com um objetivo comum,
movendo-se unidas em direção ao progresso e ao desenvolvimento coletivo. Na
prática, PROUT define samaj como uma unidade socioeconômica formada com base no
potencial econômico, nos problemas locais e na similaridade geográfica,
cultural e histórica de uma região.
O
fortalecimento da cultura local é um requisito para que a sociedade se torne
saudável e próspera. Essencialmente, samaj é um agrupamento socioeconômico com
as seguintes características: população com idioma, cultura e história comum;
economia descentralizada progressista, baseada na democracia econômica; vida
cultural e intelectual florescente; atmosfera geral de igualdade social;
espírito de se desenvolver coletivamente e lideranças com força moral. A idéia
de formar samajas tem o intuito de aplicar PROUT nas esferas socioeconômica,
sociopolítica e sociocultural, de forma prática.
De
modo geral, as fronteiras entre as nações ou os estados foram constituídas de
acordo com as diretrizes políticas. Logo, quando se definir os critérios para a
formação de unidades de samaj, as fronteiras não serão consideradas
rigorosamente. Na medida em que houver uma confrontação da exploração
capitalista, a formação de samajas será uma conseqüência natural e inevitável.
Existem
muitos movimentos em prol da independência regional, tanto econômica como
cultural: o movimento pela independência da porção francesa, no Quebec, Canadá;
a insurgência “zapatista”, no México, e dos nativos maias, na Guatemala; o
movimento republicano irlandês; diversas revoluções na África; rebelião dos
curdos, no Iraque, e muitos outros. PROUT cita esses movimentos como exemplos
de luta contra a opressão de exploradores, mas não apóia as ações violentas e
desumanas que caracterizam a maioria deles.
Muitas
das fronteiras políticas existentes foram estabelecidas para permitir que os
colonizadores dividissem a região e a conquistassem mais facilmente. O primeiro
impacto foi a supressão da língua e dos costumes. Uma das técnicas básicas dos
exploradores capitalistas é dividir o povo e torná-lo fragilizado mentalmente,
impondo o idioma, inculcando complexos de inferioridade, estabelecendo divisões
regionais e criando rejeição religiosa, para criar conflitos internos.
Tomando-se
como exemplo a Grã-Bretanha, podemos ver que diversos povos, com cultura e
idioma próprios, foram subjugados, tanto cultural quanto economicamente. Escócia,
País de Gales e Irlanda do Norte são exemplos de unidades socioeconômicas
potenciais e futuras áreas de samaj. Cada uma dessas áreas sofre com a
dependência econômica e política da Inglaterra e com a supressão do idioma e da
cultura local. Na Índia, o estado de Bengala foi dividido pelo império
Britânico e, posteriormente, pelo governo indiano independente. Tudo isso foi
feito com o objetivo de desintegrar e explorar economicamente um povo próspero
e culturalmente forte. Em quase todo o planeta, esse mesmo fenômeno pode ser
observado. A proposta de PROUT é fortalecer a cultura e economia local e
integrar as nações por uma Constituição Mundial e uma Declaração de Direitos
Universais.
Um
agrupamento de vários samajas adjacentes poderá constituir uma Federação de
Samajas. PROUT não apóia o regionalismo ou o nacionalismo exacerbado ou vulgar.
Pelo contrário, pode-se dizer que samaj é a unidade básica de uma cultura
global forte. Muitos relacionamentos entre nações, no passado e no presente,
foram ou são caracterizados por situações de colonialismo, imperialismo e
outros tipos de exploração. PROUT promove o intercâmbio de diversas culturas,
fortalecendo cada uma delas na sua origem. Quanto mais as culturas interagirem,
tanto mais os seres humanos se desenvolverão. As pessoas devem ter a liberdade
de escolher o país em que querem viver, desde que unam seus interesses
econômicos aos interesses locais.
O
propósito de formar unidades socioculturais e socioeconômicas é debelar a
exploração, e não estimular tendências divisoras. Há muitos indícios de
movimentos de samaj por todo o mundo; e, na medida em que os defeitos do
capitalismo e do comunismo ficarem evidentes e a consciência social se
desenvolver, certamente esses movimentos terão maior magnitude.
De acordo com PROUT, é necessário prestar
assistência econômica e fazer planos de desenvolvimento multidimensional de
curto prazo, para os casos urgentes. Existe mais de um bilhão de pessoas que
passam fome no mundo, e por isso deve haver suprimento imediato de alimentos
para os países ou as regiões com população subnutrida. A causa desse problema é
a má distribuição de renda. A democracia econômica, a descentralização e o fim
do imperialismo são medidas que demandam muito tempo, mas a escassez de
alimento em algumas regiões deve ser solucionada urgentemente. O excedente de
alimento dos países desenvolvidos poderia facilmente suprir as necessidades das
nações subdesenvolvidas se houvesse interesse nesse sentido.
Planos
de desenvolvimento multidimensional devem ser direcionados para as áreas mais
pobres de um país, visando elevar de imediato o padrão de vida da população
local e promover o desenvolvimento geral por todo o mundo. Tais programas podem
incluir assistência permanente e temporária e elevar o nível de educação das
classes pobres.
Devido
ao crescimento econômico desigual em diversos países, faz-se necessário prestar
esse serviço, mas eles não devem ser controlados por partidos políticos. De
acordo com o local, o mais urgente pode ser o suprimento de alimento a preços
módicos, mas também pode ser necessário providenciar o fornecimento de roupa,
remédio, material escolar etc. Nós podemos observar que, em muitos países, a
maioria das pessoas pobres é analfabeta. Onde há essa deficiência, programas de
alfabetização devem ser iniciados, como a primeira etapa de um plano de
desenvolvimento.
Exemplos
de programas assistenciais, no Brasil, são as campanhas da Ação da Cidadania
Contra a Miséria e Pela Vida, iniciadas pelo sociólogo Herbert de Souza, o
Betinho. Elas mobilizaram cerca de 50.000 pessoas organizadas em comitês
locais, distribuídos pelo país. Na campanha “Natal Sem Fome 97”, a Ação da
Cidadania distribuiu 100 mil cestas básicas para famílias carentes. Além de
distribuir alimentos, a campanha trabalha muito a questão da cidadania, da
conscientização e do espírito de coletividade.
PROUT também apóia projetos de comunidades rurais
que sejam modelo de desenvolvimento integrado e ecológico. Essas áreas
destinadas à aplicação prática dos princípios de PROUT são chamadas de
“Unidades Mestras”. Estimulando o desenvolvimento da agricultura e de pequenas
indústrias, as Unidades Mestras expandirão sua atuação, de modo que possam atender
as diversas necessidades humanas, como a educação, o emprego, a cultura, a
espiritualidade etc.
A
agricultura orgânica, a utilização de técnicas modernas de cultivo e o
desenvolvimento de pequenas indústrias que utilizem as matérias-primas locais
são projetos essenciais. Centros médicos e hospitais, que incluam práticas de
medicina holística, e projetos para a construção de casas populares são também
importantes. Uma outra atividade desenvolvida nas Unidades Mestras é o ensino
com uma abordagem holística e neo-humanista.
As
Unidades Mestras incorporam uma variedade de projetos econômicos e sociais.
Alguns exemplos de projetos a serem desenvolvidos nas Unidades Mestras são:
moinhos; padarias; bancos de sementes; centros de produção de sementes e mudas
para a população local; cultura do bicho-da-seda e tecelagem da seda;
biodigestores, para a produção de gás natural; indústrias de laticínios;
apicultura; centros de treinamento e pesquisas; e manutenção de reservas
florestais.
Por
seu empenho para melhorar a ecologia e a comunidade, as Unidades Mestras
constituem projetos-piloto de uma vida social futura, que garantirão as
necessidades físicas, mentais e espirituais do indivíduo e preservarão o
equilíbrio ecológico da flora e da fauna. Atualmente, existem Unidades Mestras
em processo embrionário nas proximidades dos municípios de Juiz de Fora (MG),
Tatuí (SP) e Porto Alegre (RS).
PROUT aborda tais problemas de forma criativa e
integrada. Todos esses problemas estão associados a um contexto social,
portanto, é preciso combater suas causas.
Crime e Justiça
O conceito de justiça varia de acordo com a cultura, a época e o desenvolvimento local. A concepção comum de justiça é a de que deve haver uma punição justa para cada crime. Este é um conceito oriundo de uma sociedade mercantil — o de troca do mal sofrido por uma pena que compense esse mal. Mas isso é um processo relativo. O que é justiça numa época, ou numa determinada sociedade, pode não constituir justiça em outra. PROUT defende a recuperação do criminoso, em vez da punição. Como seres humanos, a nossa capacidade de julgamento é limitada e passível de erro. Por isso, não deveríamos enfocar a punição, mas sim a recuperação dos criminosos. A justiça em PROUT consiste em um código de medidas corretivas. (Se houver exemplos nos livros de Bábá, enriquecer com exemplos. tipo trabalhos forçados etc.)
Num
julgamento, há sempre margem de erro. Não há como constatar a veracidade dos
testemunhos. A acusação deve investigar e apresentar as provas. É muito
perigoso julgar apenas com base na interpretação dos advogados.
Os
criminosos não devem ser classificados em uma mesma categoria, pois há diversos
motivos que levam a pessoa a cometer crimes. A teoria proutista classifica os
criminosos em cinco categorias. Em primeiro lugar, há o criminoso por instinto
— geralmente, uma pessoa que tem prazer em cometer pequenos delitos. Apesar de
sua forte tendência ao delito, esse tipo de criminoso não comete faltas graves
nem é de difícil reabilitação.
A
segunda categoria é a do criminoso por hábito. Esse pode ou não ser
inteligente, mas comete crimes inteligentemente elaborados e em geral revela crueldade
e incapacidade de compaixão. Ele pode ter comportamento criminoso habitual e
possuir moral baixa. No entanto, por meio de educação apropriada, ele demonstra
capacidade de recuperação.
A
terceira categoria é a da pessoa que se torna criminosa por imposição do
ambiente. A pressão de amigos ou familiares é a causa mais comum desse tipo de
criminoso. Em geral, os pais depravados passam suas tendências para os filhos.
Ao lidar com essas pessoas, é importante descobrir de onde vem a má influência,
para poder lidar com o caso. As pessoas que se enquadram nessa categoria tendem
a se degenerar quando postas em prisões com criminosos por hábito.
O
criminoso por necessidade forma a quarta categoria. A maior parte dos crimes
ocorridos no mundo é cometida por pessoas que não tiveram acesso às
necessidades básicas da vida. No sistema PROUT, uma vez que a sociedade
garantirá as necessidades básicas da vida, esse tipo de criminoso praticamente
deixará de existir. As pessoas que se enquadram nessa categoria, ao invés de
roubar, deveriam exercer pressões sociais para forçar mudanças no padrão de
vida. A sociedade não tem o direito de condenar comportamentos desse gênero, já
que ela é a própria causadora.
A
quinta e última categoria de criminoso é de pessoas que cometem crime por
decisão momentânea. Essa é uma condição temporária de desequilíbrio mental, que
pode ser refeita, como no caso de crimes passionais ou de cleptomaníacos. A
reabilitação mental desse tipo de criminoso seria mais eficaz do que a prisão.
Ao
invés de mandar os criminosos para a prisão, onde eles se tornam brutalizados e
aprendem novas técnicas criminosas, PROUT defende a criação de Centros de
Reabilitação, onde psicólogos, sociólogos e outros profissionais possam
trabalhar juntos para curar as tendências congênitas dos criminosos e educá-los
de forma apropriada.
Superpopulação
Dois
fatores devem ser considerados quando falamos sobre a questão do crescimento
populacional: a disponibilidade de recursos e a disponibilidade de espaço. Apesar
de o planeta ser grande e ter recursos suficientes para atender as necessidades
alimentares de todos os seus habitantes, existem milhões de pessoas sem
alimento porque há enormes desperdícios, além de faltar planejamento,
coordenação e distribuição apropriada. Se a área habitável deste planeta fosse
utilizada apropriadamente, haveria espaço para todos os seres humanos e todas
as espécies.
De
acordo com PROUT, existem quatro fatores que podem levar a um crescimento
populacional de forma natural.
Democracia
econômica, para que as pessoas tenham acesso às necessidades alimentares.
Assistência
médica, de modo que as pessoas possam se manter saudáveis.
Educação,
para melhorar o nível intelectual da humanidade.
Tanto
quanto possível, as pessoas devem estar livres de preocupações desnecessárias e
estresse mental.
Se
todas essas medidas forem adotadas, o crescimento populacional ocorrerá sem
grandes problemas. Em qualquer país, quando o padrão de vida do povo aumenta, o
crescimento populacional diminui, independentemente das crenças religiosas e de
outros fatores culturais locais. Em países subdesenvolvidos, como a China e a
Índia, e também em países desenvolvidos com grande número de pessoas pobres,
como os Estados Unidos, o crescimento populacional está aumentando. Em países
como a Suíça, a França e os Países Escandinavos, o crescimento populacional é
estável, devido às boas condições financeiras da população, sendo que, às
vezes, esse crescimento é negativo.
A
tecnologia agrícola tem dado grandes passos para que o planeta, um vez
administrado apropriadamente, se torne capaz de atender as necessidades de sua
população. A idéia de que o mundo corre o risco de se tornar superpovoado está
sendo utilizada para defender os interesses de certos grupos, para confundir e
explorar as pessoas, e para desviar a atenção de assuntos como a exploração e a
injustiça econômica.
Poluição
Pode-se
dizer com bastante segurança que os interesses financeiros são os maiores
responsáveis pela destruição ambiental. A maioria das novas tecnologias e dos
avanços científicos cria efeitos danosos ao meio ambiente, que levam tempo para
serem notados e eliminados. Os processos corretivos são caros e diminuem o
lucro das indústrias, resultando em forte oposição à implementação de medidas de
proteção ao meio ambiente.
São
as grandes corporações que controlam a maioria dos recursos e o progresso da
ciência. A pesquisa científica independente, que visa resolver os problemas
ecológicos, nem sempre consegue financiamento, especialmente se vai de encontro
aos interesses das grandes indústrias. Por exemplo, a pesquisa de combustível
não-fóssil sem dúvida continua existindo, porém com recursos ínfimos em relação
ao que se gasta com a exploração do petróleo. Destina-se algum recurso a fontes
alternativas de energia em geral — solar, eólica, biogás etc. — porém em escala
muito menor do que o que se destina à energia nuclear.
A
pesquisa científica não deve ser determinada pela perspectiva de lucro. PROUT
propõe que as indústrias estratégicas e de larga escala (transporte,
comunicação, energia, mineração etc.) sejam controladas pelo governo local e
funcionem sem visar ao lucro. A pesquisa científica não se sujeitará aos
interesses das grandes corporações. Os recursos locais, tanto naturais como
sintéticos, serão utilizados para desenvolver a indústria local. As indústrias
poluentes devem bancar a restauração do meio ambiente. Nos cálculo dos custos
totais de produção devem estar incluídas as despesas necessárias para a
recuperação ambiental e social.
Por
exemplo, do ponto de vista social, a indústria de caminhões é antieconômica,
pois não leva em conta os seguintes fatores: manutenção das estradas; impacto
ambiental; diminuição das reservas de petróleo; danos à saúde causados pela
poluição ambiental; trânsito; acidentes e o estresse mental causado aos
motoristas de caminhão e suas famílias. Considerando todos esses aspectos,
conclui-se que o sistema ferroviário é muito melhor que o sistema rodoviário.
O
conceito de custo social está inteiramente relacionado com a idéia de
desenvolvimento sustentável. Na agricultura, os benefícios de curto prazo
obtidos com o uso de agrotóxicos não compensam os prejuízos causados a longo
prazo. A poluição de pesticidas e fertilizantes químicos pode ser reduzida com
a descentralização da agricultura e o uso de técnicas agrícolas integradas (ver
Capítulo 3). A pesquisa agrícola deveria se preocupar com o desenvolvimento
sustentável, a qualidade do produto e a eficiência. Pesquisas recentes
comprovaram que o uso de técnicas naturais aumenta a produção, além de melhorar
o sabor e o valor nutritivo dos alimentos. (documentar a origem dessa pesquisa,
se possível... ...)
Para
assegurar o desenvolvimento econômico sustentável, tudo que deteriora a
capacidade de regeneração das reservas naturais e afeta a saúde dos seres
humanos e de outros seres deve ser evitado. Mas o caminho da chamada economia
global é exatamente o oposto. No sistema capitalista, os ganhos de curto prazo
são mais importantes do que qualquer consideração sobre o futuro. Tem sido
anunciado por cientistas em conferências internacionais, como no encontro
chamado Eco 92, no Rio de Janeiro, que a economia global está destruindo o meio
ambiente numa velocidade mil vezes maior do que ele se pode restaurar.
Foi
previsto que, se a destruição ambiental continuar na velocidade atual, ela
acabará com a camada de ozônio, o ar puro, o solo fértil, as águas potáveis e
as florestas em aproximadamente 50 anos. Então, é uma questão de vida ou morte
reduzir o poder de decisão econômica das grandes corporações. Elas têm ignorado
quase sempre a questão do bem-estar coletivo e continuarão a fazer assim, a
menos que o povo detenha seu poder de influência.
Leituras adicionais:
Discussões dos tópicos acima poderão ser
encontradas em literatura sobre PROUT. Na série “PROUT in a Nutshell”,
encontram-se várias referências a samajas. Para discussões sobre o crime e a
justiça, pode-se consultar “Human Society, Part One”. Um artigo sobre o
crescimento e o controle populacional é encontrado em “Democracia Econômica”.